Decorreu na noite de 7 de outubro de 2025, por videoconferência, a primeira sessão do ciclo «A “Gaudium et spes”, 60 anos depois: A esperança cristã no mundo de hoje», organizado pelo Centro de Cultura Católica (CCC) e pelo diaconado permanente portucalense, com a colaboração com alguns secretariados diocesanos, em sintonia com o Plano Diocesano de Pastoral 2025/2026 e no contexto do 60º aniversário do encerramento do II Concílio do Vaticano. Numa sessão muito participada, que contou com 103 dispositivos informáticos ligados, abriu o ciclo Maria do Rosário Soveral, professora no CCC, com uma conferência introdutória sob o título «A “Gaudium et spes” no seu tempo: génese e significado».
A conferencista começou por referir que a comemoração da constituição pastoral «Gaudium et spes» e a reflexão sobre a mesma podem contribuir para a renovação da esperança que não dececiona, no seguimento a bula do papa Francisco de convocação do Jubileu ordinário que a Igreja está a celebrar. O documento conciliar transmite a alegria e a esperança no contexto da sociedade ocidental marcada pela emancipação da pessoa humana. Na decorrência do discurso de João XXIII na abertura do Concílio, reflete uma mudança de atitude da Igreja face à modernidade, à cultura contemporânea e às questões sociais. A Igreja não se apresenta como uma fortaleza fechada numa atitude defensiva, mas em abertura ao mundo, numa atitude de atenção e de escuta para poder expressar uma palavra pertinente.
Elaborado entre 1962 e 1965, sendo promulgada a 7 de dezembro, o documento explicitou o conceito de “pastoral” como atenção ao mundo e diálogo, colhendo os modelos “renovador” e “novo” que atravessaram o curso da sua elaboração. Na sua génese está o espírito de renovação do Concílio que pretende relacionar-se com toda a humanidade, oferecendo-lhe uma cooperação sincera nas suas inquietações. O texto está marcado por um profundo antropocentrismo, considerando o homem como corpo e alma, coração e consciência, inteligência e vontade.
Na origem do documento não está apenas a modernidade na rutura com a Igreja, a partir das tensões emergentes desde o renascimento, quando a Igreja foi deixando de ser elemento agregador da sociedade. Na origem estão também pessoas e movimentos que foram apontando para a abertura que o documento proporcionou, designadamente no campo social e da teologia. Foram evocados os caminhos trilhados pelos movimentos operários da Ação Católica, pelo dos padres operários, pelos de incidência ecuménica, bem como pelos grandes teólogos e correntes que animaram a reflexão teológica nas décadas precedentes ao Concílio, que muito contribuíram para o rumo por ele tomado. Foram ainda consideradas a inquietações relativas à paz decorrentes da II Guerra Mundial e das guerras que sucessivamente emergiram, bem como o cenário real de guerra fria, com o medo permanente de uma guerra nuclear.
A conferência ainda lançou os olhos sobre «Gaudium et spes» na articulação das suas partes, expressiva da abertura ao mundo: uma primeira parte em que emerge a reflexão doutrinária sobre o ser humano criado à imagem de Deus, com liberdade e consciência moral, e sobre a vida em sociedade, em que adquire relevo a solidariedade; uma segunda parte alusiva às inquietações da humanidade com os seus principais desafios, designadamente a justiça social, a desigualdade entre os povos, a família e o matrimónio valorizando o laicado na missão da Igreja, a cultura e a educação, a economia e o trabalho, a atividade política, a paz e a política internacionais com a colaboração entre as nações. Para tanto, a Igreja necessita de estar atenta aos sinais dos tempos, interpretando-os à luz do evangelho.
A conferência prolongou-se ainda nas questões e observações dos presentes que permitiram alguns comentários e achegas por parte da conferencista.
A reflexão sobre a «Gaudium et spes» e sobretudo sobre as principais questões da relação entre a Igreja e o mundo na sua evolução e na sua pertinência atual continuará nas próximas sessões do ciclo. A seguinte, a realizar também por videoconferência, está agendada para 4 de novembro, às 21 horas. Pedro Valinho Gomes, da Universidade Católica de Lille, aborda o tema «Dignos de esperança: atualidade de uma conceção conciliar da pessoa humana».